quarta-feira, 19 de março de 2008

A SEMANA SANTA EM PONTE DE LIMA, 1876

As solenidades da Semana Santa, em Ponte de Lima, eram brilhantes.
Em 1876, de acordo com a descrição de “O Commercio do Lima”, na quarta-feira, dia 12 de Março, na Igreja Matriz, com acompanhamento musical da orquestra do maestro Jerónimo Xavier Varela, que para o efeito compôs uma nova melodia, efectuaram-se “os ofícios das trevas”, repetidos no dia imediato, mas, então, finalizados com o “costumado sermão da Instituição da Eucaristia”, pelo Cónego Alves Mateus[i], da Sé de Braga, “que maravilhou a todos”.
Nessa quinta-feira, “pelas 9.30h da noite saiu processionalmente da vetusta Igreja da Misericórdia a veneranda imagem do Senhor da Cana Verde”, percorrendo seis das sete habituais estações, pois a chuva obrigou a que a Procissão regressa-se à Igreja. Em todas as 7 igrejas (Matriz, Misericórdia, Terceiros, Santo António dos Frades, Guia, Rosário e Santo António da Torre Velha) “havia Lausperene com mais ou menos profusão de lumes, tornando-se verdadeiramente notáveis as três primeiras, nessa parte, e também pelas luxuosas decorações com que se achavam adornadas.”
Na sexta-feira, realizou-se a procissão do Enterro e novo sermão, a cargo do referido pregador. Nessa noite, “os mesmos ofícios, e findos eles o sermão da Soledade pelo mesmo eloquentíssimo orador”.
No dia seguinte, sábado, pela manhã, realizaram-se “as cerimónias que costumam proceder a Aleluia”, terminando, desta forma, a celebração da Semana Santa de 1876.
Anteriormente, outras manifestações de fé tinham sido efectuadas: na tarde de sexta-feira, 7 de Março, a Via-Sacra, pelas “ruas do costume, na melhor ordem e acerto, e seguida dum grande número de fiéis”, recolhendo “ao majestoso templo da Venerável Ordem Terceira de S. Francisco da Penitência”, onde subiu ao púlpito o Cónego Figueiredo; na noite do dia seguinte, em Procissão, “foi conduzida para a Igreja de Nossa Senhora do Rosário a Imagem veneranda do Senhor dos Passos, pertencente à Igreja de Santo António dos Frades”. Esta procissão mereceu o desacordo de “O Commercio do Lima” - ao que supomos por rivalidades políticas - que zurziu o acompanhamento da banda de música Velha, “tão desafinada, especialmente desde que dela faz parte o ex-director da música Nova – Joaquim Valente”, e, o que ao grande número de fiéis presentes causou espanto, “levar-se a cruz alçada com véu, e a imagem sem ele...”, espanto que “deixou de existir logo que se soube quem foram os hábeis directores desse acto soleníssimo./Pelo dedo se conhece o gigante...”; no domingo, dia 9 de Março, a Procissão de Passos, concorrida, ajudada pelo bom tempo, por “incalculável número de fiéis”. A procissão, com a participação de “quase todos os eclesiásticos deste concelho”, e numerosos “anjos e figuras... geralmente bem vestidos, sobressaindo pela simplicidade dos adornos”, e ainda, fruto de convites especiais da comissão organizadora, – que, ao que parece, não era a mesma da procissão do dia anterior – “as pessoas mais gradas deste município, o que lhe dava grande realce, e se tornava verdadeiramente notável”. Como notável foi, na opinião do jornal, o “discurso” do Cónego Figueiredo, da Sé de Braga, que “excedeu todas as expectativas”, já na Igreja Matriz, para onde recolheu o préstito.

[i] - O Cónego Joaquim Alves Mateus (1831 ou 1835-1903), nascido em Santa Comba Dão, foi um dos mais destacados pregadores da sua época, tendo, ainda, participado na vida política, como parlamentar, parece que do Partido Reformista (dizendo Eça de Queirós, em “Uma Campanha Alegre”, que essa formação partidária não tinha ideias, era, apenas, “o papagaio do Constitucionalismo”) e, segundo afirmam e alguns seus escritos atestam, um liberal, que falando acerca o Brasil, enaltece o “Imperador [D. Pedro II] ilustrado, religioso, liberal e magnânimo, que honra o princípio monárquico, que vive triste por não ver apagado ainda de seus estados o quadro tristíssimo da escravatura...” (cf. Augusto de Carvalho, “O Brasil – Colonização e Emigração", Porto, 1875).
Ilustração: Fotografia, Museu dos Terceiros, de Vieira, Amândio de Sousa, "Ponte de Lima, Minha Pátria", 1996

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