Este estudo do Luís Dantas, um autor de consagrados recursos literários e investigantes, trata de aspectos da vida de António Feijó, o mais significativo poeta nascido em Ponte de Lima, ocorridos de 1880 a 1885, com primórdio em Coimbra e Ponte de Lima mas, como toda a actividade telúrica, com desenvolvimentos e repercussões em distintos locais.
De permeio abre espaço a outras personalidades, quer directa ou colateralmente envolvidas nas situações descritas ou necessárias para a compreensão das mesmas: do incontornável Luís de Magalhães a Guerra Junqueiro, de António Fogaça a António Inácio Pereira de Freitas, de João Gomes de Abreu a José Trindade Coelho, de Abílio de Campos Monteiro a José de Sá Coutinho... numa correria de nomes e situações a atestar a vivacidade do vate Feijó e afastando o semblante soturno com que ele, a maioria das vezes (em recatada sisudez), é retratado.
A obra permite-nos espreitar o jovem Feijó (dos 21 aos 26 anos), com toda a sua imaginação, irreverência e sagacidade, começando pela caricata e elucidativa história em torno do governador civil de Coimbra, José Pereira, a quem a paixoneta libidinosa arrastou para um confronto com a Academia. Já, então, Feijó se afirmara poeticamente e preparava para, nas comemorações do tricentenário de Camões, recitar Sacerdos Magnus, no Teatro Académico, em Coimbra, e tinha posto Ponte de Lima em polvoroso com a sua tenebrosa Quadrilha dos Carecas, de que se libertou, com a complacência do Dr. Freitas, ao alegar um caso de alucinação.
É um dos fundadores, na cidade de Coimbra, em Dezembro de 1880, da Revista Científica e Literária que termina 3 meses e números decorridos. O Comércio do Lima que, em Ponte de Lima, lhe tinha acolhido, em Setembro do mesmo ano, a história dos carecas ainda se consegue publicar até Julho de 1881, afirmando alguns que ao seu desaparecimento não foram alheias as repercussões dessa história.
Sobra fôlego ao autor para nos levar em visita às Musas de Coimbra, uma das quais, tragicamente, inspirou o nosso António Feijó numa das suas mais famosas composições: o soneto Pálida e Loira, não obstante, como nos informa J. Cândido Martins[2], em patética reacção “um barbeiro miguelista e agiota de Coimbra, mestre Inácio,” ter jurado a falsidade dos versos, “já que a moça teria falecido na sua cama, e não num “caixão estreito””. E lá teve António Feijó de dedicar ao perspicaz crítico uma quadra: “Inácio, quando morreres/ Irás deitado no enxurro!/ Que o Pio não come carne/ De mula, cavalo ou burro.”
Termina Luís Dantas este florilégio (não sem antes recordar a pantomina montada por António Feijó, na Casa de N.ª S.ª da Aurora, com a conivência de um rapaz de nome abreviado Abílio de Campos Monteiro, arremedando os poderes hipnóticos do médico Freitas que traziam a vila embasbacada) referindo a convivência de António Feijó com Guerra Junqueiro, na cata de antigalhas de mistura com confidências literárias, girando o concelho de Ponte de Lima, e outras paragens deste Minho, em constantes devaneios, degustações variadas, em qualidade e consequências, como, exemplificando, a de melão da Vilariça, “...regado a um tal vinhinho branco/ De Monção, que ao pé dele, ó patriarca Noé!/ Tudo aquilo que tu bebeste era – água-pé.”
É, de forma inequívoca, um trabalho de feliz selecção e criativa escrita, de leitura atraente e recomendável, uma óptima evocação centrada em António Feijó.[3]
[1]O livro foi apresentado em 30 de Janeiro de 2009, na Escola EB 2,3 de António Feijó, em Ponte de Lima, e permito-me uma referência, de elementar justiça, à qualidade da declamação de poemas de António Feijó, na função, por alunas da mencionada escola.
[2] Feijó, António, Poesias Dispersas e Inéditas, prefácio, fixação do texto e notas de J. Cândido Martins, Edições Caixotim, Porto, 2005, pp. 278-279.
[3] Nos últimos anos, e de autores naturais de Ponte de Lima, recordam-se, em trabalho de J. Cândido Martins, as Poesias Completas (2004) e as Poesias Dispersas e Inéditas (2005) de António Feijó, e de João Araújo Pimenta, Gota – O tormento de António Feijó (2004).
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