No Lima [1]
No barco do Ponte-Nova
ou do Pai-Quim
este remansoso navegar
vai dentro de mim,
mais além do nu –
assim como o silêncio
é a essência da palavra,
e as águas são deusas
liquefeitas.
É estio no Lima.
A Casa
de Nossa Senhora de Aurora serviu como espécie de farol a relevantes actores culturais
de visita a Ponte de Lima. Entre muitos outros, por cá foi passando Sophia
de Mello Breyner Andresen:
“A descida do rio Lima é
tentadora e emocionante digressão, muito de aconselhar pelo deslumbramento da
variegada beleza panorâmica.
Apalavre-se na Além da Ponte o
«Pai Quim», o «Ponte-Nova», ou outro autóctone, e a coisa arranja-se, ainda
hoje, em 1959, por quaisquer 50 paus ou pouco mais (e comparticipação do farnel
obrigatório dos viageiros). Dura umas 5 a 7 horas na melhor época, o Estio.
Ruben A. e Sofia Andresen repetem
anualmente a façanha”[2], “com
paragem obrigatória para tomar chá no Solar de Bertiandos.”[3]
Sophia Andresen, Francisco Sousa Tavares e Ruben A., descendo o rio Lima (Fotografia sem autor identificado)
Para Ruben A. descer o
rio Lima de barco é “uma das coisas raras
no mundo, e que deve ser feita ao menos uma vez na vida (…) numa espantata de
barca antiga através do silêncio que ainda é – verdade de um dia na terra de
pegos fundos pica-peixes de popa azul salgueiros de raízes fazendo sombra
veigas de Correlhã e Paços ancestrais coisa assim deslizar roçando ao de leve
pela areia espanto que mais não há – rio de poetas Letes da antiguidade leva ao
esquecimento quem nunca tal panorâmica retinou (…)”[4]
E como correm as águas a vida vai passando, os
escritores Conde d’Aurora e Ruben A., lá desaguaram. Sophia de Melo Breyner
Andresen não os esqueceu e, em 1996, a 7 de Dezembro, voltou a ter a Casa de
Nossa Senhora de Aurora como farol, associando-se à homenagem ao primeiro, a
quem, no Largo de S. João, foi inaugurada uma estátua.
Nesse dia, “numa inesquecível manhã, partiram desta casa, no barco à vara do Pai
Quim, para descer o rio até Viana, Ruben A. e Sophia de Mello Breyner Andresen.”[5]
Porque não? A vida pode reviver.
Na Casa de Nossa Senhora de Aurora, a 7 de Dezembro de 1996, Sophia de Mello Breyner Andresen e o Embaixador João de Sá Coutinho. Fotografia de Amândio de Sousa Vieira.
No mesmo local, e data, Sophia de Mello Breyner Andresen e Amândio de Sousa Vieira. Fotografia de António Carlos Matos.
Fontes:
- Amândio de Sousa Vieira, Ponte de Lima Outros Tempos,
1.ª Edição, Ponte de Lima, 1994.
- Conde d’Aurora – Roteiro da
Ribeira – Lima, 4.ª edição (Fac-similada da Terceira (1959), e actualizada por
João Gomes de Abreu de Lima), Limici, Ponte de Lima, 7 de Dezembro de 1996.
- Liberto Cruz, José Brandão,
Nicolau Andresen Leitão, O Mundo de Ruben A., Assírio & Alvim, Lisboa,
1996.
- Maria do Rosário de Sá
Coutinho, Dr. José de Sá Coutinho, Figuras Limianas, Município de Ponte de
Lima, 2007.
[1] - José
Sousa Vieira, No Lima, Anunciador das Feiras Novas, Ano XVI, Ponte de Lima,
1999, pg. 103.
[2] - Conde
d’Aurora, Roteiro da Ribeira-Lima, 1996 (1959), pg. 109.
[3] -
Liberto Cruz, José Brandão, Nicolau Andresen Leitão, O Mundo de Ruben A., 1996,
pg. 168.
[4] - idem
[5] -
Amândio de Sousa Vieira, Ponte de Lima Outros Tempos, Ponte de Lima, 1994, pg.
115.
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